Degustação de Queijo Velho com vinho do Dão
O enólogo Virgílio Loureiro fez uma prova de degustação do Queijo Velho Vale da Estrela – DOP com vinho do Dão, que publicou na sua página no Facebook e que transcrevemos de seguida, com a devida vénia:
Hoje fui surpreendido por um queijo Serra da Estrela Velho (DOP) a entrar-me pela casa dentro.
Escusado será dizer que me preparei para o pôr logo à prova, pois já tinha sido surpreendido, há alguns meses atrás, pelo seu irmão mais novo – o amanteigado – de qualidade excepcional.
A fasquia estava, por isso, muito alta, obrigando a todos os cuidados para que a prova fosse a mais adequada.
Como ainda me restava metade da garrafa do branco velho do Dão que tinha aberto ontem, achei-o apropriado para fazer companhia ao queijo.
E passo a explicar porquê, dado não ignorar que a esta hora já haverá gente a sorrir com a escolha, pois na região do queijo e do vinho este tem de ser tinto, principalmente quando o queijo é forte e picante como o “velho”.
Eu acho que para acompanhar o queijo curado, caracterizado por sabores fortes, onde o sal e o picante sobressaem do conjunto, deve ser servido um vinho branco, cujos sabores bastante suaves não são reforçados pelo sal do queijo (um enaltecedor dos sabores).
Se fosse um vinho tinto – com sabores mais fortes e muitos taninos – deixaria um amargo na boca, tal a intensificação de sabores que o sal do queijo provocaria no sabor do vinho. A adstringência dos taninos também iria colidir com as proteínas do queijo causando uma sensação desagradável na boca (não nos esqueçamos que para tratar as proteínas da pele, na indústria dos curtumes, se usam taninos em grande quantidade, numa reacção idêntica à do queijo com vinho tinto na nossa boca).
Escolheria um branco velho por razões óbvias. Para um queijo velho, de sabor complexo, nada melhor que um vinho velho de sabores igualmente complexos.
O diálogo que ambos têm na nossa boca é surpreendente e merece da nossa parte a melhor das atenções, para nos apercebermos da perfeita harmonia que existe entre eles.
Escolheria um vinho do Dão, também por razões óbvias, pois uma região que produz duas obras de arte da gastronomia e cultura portuguesas, que ainda por cima se complementam de forma perfeita, não precisam da ajuda de ninguém.
Perante tais justificações eu faria esta festa para os sentidos ao fim da tarde ou ao jantar, antes de um doce conventual.
Se quisesse servir o queijo como única sobremesa, então teria de optar por um porto tawny de 20 ou mais anos, para poder sonhar quando fosse para a cama.
NOTA FINAL
Reconheço que quando o queijo é bom e a companhia é óptima, até o vinho tinto poderá ir bem, mas neste caso não devemos dar muita atenção ao diálogo do queijo e do vinho na boca, que deve ser trocado pela conversa animada entre amigos, como costumam fazer na minha terra, de modo a que não se note a boca amarga!